O desenho mostra a chegada dos colonos ingleses na Virgínia. A gravura é de 1590, por John White. (Domínio Público).
A colônia de Roanoke é considerada a primeira colônia inglesa da América do Norte, localizada na atual Carolina do Norte, EUA. Essa colônia foi formada em 1585 d.C., abandonada e reassentada em 1587. Sem planejamento adequado e apoio logístico, esse empreendimento estava condenado ao fracasso desde o início. Ao chegar no novo ambiente, os colonos logo entraram em conflito com os povos nativos, e o assassinato de um chefe estragaria permanentemente as relações entre colonos e nativos. O segundo grupo de colonos de Roanoke foi largado a própria sorte, e quando as atrasadas embarcações de reabastecimentos finalmente chegaram, nenhum vestígio deles foi encontrado, exceto uma palavra entalhada em um tronco de árvore com a seguinte inscrição: ‘Croatoan’.
O desaparecimento dessa colônia é um dos enigmas mais notórios da história americana; a falta de evidência concreta e as pistas deixadas no local a tornaram o foco de especulações e teorias selvagens ao longo do tempo.
1584: Primeiro Contato
A Inglaterra havia ficado para trás na corrida europeia para colonizar regiões recém-descobertas do mundo. Os portugueses há muito negociavam na África Ocidental, os espanhóis saqueavam as Américas, e a Coroa inglesa se contentava em financiar corsários para roubar navios de tesouros espanhóis. Em março de 1584, finalmente a rainha decidiu tentar um empreendimento de colonos na área nomeada de Virgínia, atual Carolina do Norte nos EUA. No verão desse mesmo ano, um grupo de ingleses visitou a região, graças a ansiedade de Sir Walter Raleigh em exercer sua concessão de seis anos concedida pela rainha Elizabeth I, com o propósito de estabelecer uma colônia no Novo Mundo. Os colonos receberam a promessa de que nessa colônia eles teriam direitos iguais a qualquer cidadão na Inglaterra.
Guerreiro nativo norte-americano. Ilustração de John White. The British Museum. (CC BY-NC-SA).
A campanha de 1584, chamada Expedição Amadas-Barlowe em tributo a seus dois líderes, desbravou a região e fez contatos com indígenas cuja principal instalação estava na ilha de Roanoke. Os ingleses mantiveram uma relação amistosa com os índios, e trocavam peixe e carne por tecido e vinho. Um chefe local até preparou um grande banquete para colonos, e dois nativos Roanoke se ofereceram para acompanhar os ingleses de volta à Inglaterra: Manteo e Wanchese. Quando Barlowe retornou à Inglaterra, descreveu a Virgínia como uma região abundante, com nativos pacíficos, e expôs objetos adquiridos através do comércio. Esta área parecia ser um local que merecia uma atenção especial e uma investigação mais aprofundada, tornando-se uma provável candidata para ser o primeiro assentamento permanente inglês.
1585: O primeiro assentamento
Novamente, Raleigh esteve à frente desse projeto para a extração de riquezas que todos esperavam da nova terra. Infelizmente, os europeus não tinham a mínima noção dos desafios envolvidos como, por exemplo: os nativos americanos que habitavam a região. Ao longo desse processo ouve dificuldades, aventura, morte e mistério. Os erros do otimismo inglês típico da época levariam ao fracasso o primeiro projeto de colonização da Inglaterra.
Em 9 de abril de 1585, o aventureiro Richard Grenville (1542 – 1591 d.C.) deixou Plymouth com sua frota de cinco navios, incluindo o Tyger de 160 toneladas fornecido pela rainha Elizabeth, com uma tripulação que incluía o jovem Thomas Cavendish (1560 – 1592 d.C.) que mais tarde circunavegaria o globo em 1586 – 88, e John White (falecido em 1593 d.C.), um notável cartógrafo e artista que mapeou e capturou os pontos turísticos desta parte do Novo Mundo, ele também havia acompanhado Martin Frobisher em sua procura pela Passagem Noroeste na década de 1570. White pintaria a imagem da colônia, os povos nativos e a vida selvagem, criando um registro pictórico magnífico. Em maio uma tempestade separou a frota de Grenville, e o navio Tyger desviou-se do curso indo parar em Porto Rico. Aproveitando a situação, os ingleses saquearam navios e portos espanhóis no Caribe. Em Hispaniola, todas as embarcações de Grenville se reagruparam e reabasteceram, com três delas fazendo o caminho através das águas rasas e difíceis da Carolina. Em julho, o Tyger encalhou e a água do mar infiltrou-se nas provisões, estragando grande parte dos alimentos destinados aos colonos.
Após a embarcação encalhar, Ralph Lane conduziu os colonos do sexo masculino para a Ilha Wokokan, incapazes de chegar ao continente. Em seguida, Grenville e Lane se desentenderam, então, os colonos resolveram se mudar para o extremo norte da Ilha Roanoke depois que Grenville retornou para a Inglaterra em busca de suprimentos. Lane ficou com um pequeno navio para explorar a área. Os colonos tiveram a ajuda dos índios Manteo e Wanchese que atuaram como intermediadores, assim, colonos e nativos de Roanoke estabeleceram um pequeno comércio. Lane ouvia dos índios que haveria ouro e cobre ao norte, então, ele liderou uma campanha até a Baía de Chesapeake.
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A relação entre colonos e nativos de Roanoke ia bem até a primavera chegar e os suprimentos de comida dos colonos ficarem escassos. Os europeus haviam chegado tardiamente para cultivar seus próprios alimentos e o inverno se aproximava – embora poucos deles tivessem habilidade agrícola de qualquer maneira – e o fim das pequenas lojas quando o navio Tyger encalhou agora era revelada. Não se sabe ao certo porque os indígenas Roanoke não forneceram uma parte de seu curto estoque de alimentos, e tornaram-se cada vez mais hostis. Em junho, o índio Manteo alertou Lane sobre a organização dos nativos para atacar a colônia, então, Lane atacou primeiro, matando o chefe Wingina. Para a sorte dos colonos a ajuda externa chegaria uma semana depois.
Enquanto isso, Grenville buscava oportunidades de obter pequenos lucros, como fez ao capturar o navio Santa Maria de San Vicente, de 300 toneladas nas Bermudas, a caminho de casa. A embarcação transportava açúcar, marfim e diversas especiarias que custearia a expedição. O marinheiro Grenville retornou à Virgínia no verão seguinte com novas provisões para o assentamento, mas, sem o seu conhecimento, Lane, Sir Francis Drake e seus companheiros já haviam partido para a Inglaterra em 19 de junho de 1586. Mesmo surpreso com o ocorrido, Grenvill decidiu deixar 15 homens e dois anos de suprimentos para que eles se mantivessem até a chegada de novos colonos, mas esses homens nunca seriam vistos ou ouvidos.
1587: A 'Colônia Perdida'
Mesmo com grandes provações e aflições da primeira tentativa de colonização, o interesse dos ingleses foi despertado pelos colonos que retornavam à Inglaterra e exibiam novidades como o tabaco e batatas. Em 1587, Raleigh organizou uma segunda campanha de colonização a Roanoke, com John White como governador da colônia, dirigindo 117 colonos, incluindo 17 mulheres e 11 crianças. Cada família receberia cerca de 200 hectares de terra doados a eles pela Coroa inglesa – pressupunha que essa região pertencia a rainha Elizabeth I na ausência de qualquer outra presença europeia, desconsiderando o direito dos nativos. O plano de Raleigh era escolher um novo local na Baía de Chesapeake, mas as tripulações das embarcações estavam mais interessadas em realizar ataques a navios no Caribe do que navegar em vias inúteis. Em 22 de julho de 1587, os colonos foram deixados novamente na Ilha Roanoke. Obviamente, os nativos Roanoke não haviam perdoado ou esquecido o ataque à sua aldeia nem a decapitação do chefe Wingina em 1585, realizados por Lane. Sendo assim, não haveria esperança para esses novos colonos firmarem uma parceria comercial pacífica. Isso ficou claro em 28 de julho quando o colono George Howe foi encontrado morto na praia.
Em agosto, White foi convencido pelos colonos a viajar para à Inglaterra com a missão de persuadir o governo a enviar suprimentos em caráter de urgência. Embora isso significasse deixar sua família, incluindo sua neta, Virginia Dare, o primeiro colono inglês a nascer nas Américas. White chegou à Inglaterra em outubro de 1587, mas, só em abril de 1588 ele pode retornar para Roanoke com dois navios de suprimentos. Infelizmente, a Armada Espanhola atacou a Inglaterra, obrigando White a retornar com seus navios, e adiando o retorno a Roanoke até agosto de 1590. Quando finalmente White conseguiu voltar à colônia, não havia vestígios dos colonos na paliçada abandonada, exceto uma palavra misteriosamente esculpida em um tronco de árvore: ‘Croatoan’. Este era o nome de uma ilha próxima (hoje chamada de Ilha Hatteras) e sugere que os colonos resolveram se mudar para lá. A presença dos nativos Hatteras na ilha sugere uma teoria de que os colonos ingleses se uniram ao grupo indígena tentando superar a escassez de alimentos. Essa teoria é baseada em uma suposta evidência encontrada na ilha – pedras entalhadas supostamente por Eleonor Dare, filha de John White. Nessas pedras contêm textos que contam histórias do destino dos colonos ingleses e anedotas pessoas de Dare e seu pai. Embora muitos acreditem se tratar de uma falsificação, há uma crença acadêmica de que pelo menos uma das pedras seja autêntica.
White tentou explorar essa Croatoan, mas foi obrigado a retornar à Inglaterra devido as fort tempestades. Roanoke tornou-se conhecida como a ‘Colônia Perdida’, e ninguém jamais descobriu o paradeiro dos colonos desaparecidos. A maioria dos estudiosos acredita que eles foram mortos por nativos-americanos em retaliação ao ataque liderado por Lane contra uma das tribos em 1585 d.C.
Legado e rumores
Um dos colonos de Roanoke de 1585, Thomas Hariot (1560 – 1621 d.C.), descreveu suas experiências em A Brief and True Report of the New Found Land of Virginia. Este relato publicado em 1588, e traduzido para alemão, francês e latim, foi de grande importância para convencer as autoridades de que a América do Norte seria uma grande fonte de riqueza. Esse documento também incluiu 23 desenhos de John White preservando para a posteridade a visão inicial dos nativos americanos na região, além das cartas de navegação e registros da fauna e flora locais. Com o fracasso de Roanoke, Walter Raleigh resolveu partir para sua primeira campanha em busca do El Dorado na América do Sul em 1595. Essa expedição pode ter sido motivada pelo desejo de restaurar sua posição na corte de Elizabeth após a fracassada tentativa de colonizar Roanoke.
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Em 1607, os colonos ingleses retornaram à América do Norte e fundaram a colônia de Jamestown na Virgínia. Treze anos depois, os Peregrinos do Mayflower, constituíram a colônia de Plytmouth, em Massachusetts. Em 1608, os ingleses de Jamestown tentaram descobrir o que havia acontecido com os colonos de Roanoke, mas só havia rumores entre os indígenas. Diversos nativos contaram histórias sobre pessoas de pele clara e cabelos louros que viviam no Sul, mas nada de concreto surgiu. Em 1612, William Strachey, colono de Jamestown, escreveu em sua obra History of Travel in Virginia Britannia que os colonos de Roanoke pretendiam estabelecer um assentamento na região da Baía de Chesapeake, destino original dos colonos, mas eles foram mortos por índios lá. Outra história conta que sete colonos conseguiram escapar com vida do massacre e passaram a viver com índios mais ao sul, mas nenhuma evidência concreta foi encontrada. No entanto, a tribo indígena dos Lumbee afirma em sua história ancestral que os sobreviventes de Roanoke, os últimos membros da ‘Colônia Perdida’ foram realmente integrados aos nativos. Em 2020, uma pesquisa arqueológica na região que durou 10 anos, revelou artefatos que sugere a integração dos colonos e tribos indígenas locais, mas o verdadeiro paradeiro dos colonos de Roanoke continua sendo um grande mistério.
Bibliografia
HOGEBACK, Jonathan. "The Lost Colony of Roanoke". Encyclopedia Britannica, 12 ago. 2016, https://www.britannica.com/story/the-lost-colony-of-roanoke. Acesso em: 10 de abr. de 2023.
BRIDGEN, Susan. New Worlds, Lost Worlds. Penguin Books, 2002.
CARTWRIGHT, Mark. "Roanoke Colony." World History Encyclopedia. World History Encyclopedia, 18 Jun. 2020. Acesso em: 8 de maio de 2023.