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Crânio do "homem-dragão". Imagem: XIJUN NI. Divulgação
O crânio extraordinariamente completo do “Homem-Dragão” foi encontrado na província de Harbin logo após a invasão japonesa ao nordeste da China no início de 1930. Um grupo de moradores construía uma ponte quando um dos operários tropeçou no crânio em meio a lama do rio. O fóssil humano quase completo era alongado e possuía saliência na região das sobrancelhas e as cavidades oculares quadradas.
Agora, mais de 90 anos da sua descoberta, uma pesquisa publicada no Periódico The Innovation afirma que esse crânio é o vestígio de uma nova espécie humana: o Homo longi, ou o homem-dragão.
“É enorme”, afirma Chris Stringer, paleoantropólogo do Museu de História Natural de Londres. O crânio apresenta características tanto antigas quanto modernas, uma localização única na árvore genealógica humana. Outros dois estudos revelaram que o fóssil bem preservado provavelmente é proveniente de um homem que morreu há no mínimo 146 mil anos. “Já segurei muitos outros crânios e fósseis humanos, mas nunca algo assim”, afirma Xijun Ni, paleoantropólogo da Academia Chinesa de Ciências, autor de todos os três estudos.
Observando o tamanho e o formato do crânio, e comparando com outros fósseis humanos já conhecidos, os pesquisadores acreditam que haja uma ligação parental próxima com vários outros restos mortais encontrado na Ásia. Essa análise sugere que o crânio seja mais próximo da nossa espécie – até do que os neandertais.
Pesquisadores encontraram evidências de que o homem-dragão possa ter ligações com os misteriosos denisovanos – grupo humano irmão dos neandertais. Poucos fósseis desse grupo foram encontrados: alguns dentes, um osso do dedo, um pedaço de crânio fraturado e uma mandíbula partida.
História do crânio
Após ser encontrado, o crânio foi guardado secretamente em um poço abandonado, e reencontrado apenas em 2018, quando o operário que o encontrou pela primeira vez revelou o segredo para seus netos, que informaram ao paleontólogo Qiang Ji o achado. Ji fotografou o crânio e enviou as imagens para Xinju Ni. O fóssil estava bem preservado e chamou a atenção pela saliência na região das sobrancelhas, comum entre os hominídeos antigos. Restou apenas um dente no crânio, mas esse dente apresenta uma característica rara entre os humanos modernos; possui três raízes.
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A família que encontrou o crânio foi convencida a doar o espécime ao Museu de Geociências da Universidade de Geociências de Hebei, China. Os dados de mais de 95 fósseis de crânios, mandíbulas e dentes foram reunidos em um supercomputador para gerar bilhões de árvores filogenéticas. A árvore gerada colocou o crânio do homem-dragão em uma nova ramificação com um parentesco com a nossa espécie. Stringer, autor de dois dos estudos com o crânio, conta que ficou surpreso com tal proximidade e esperava que o fóssil de Harbin fosse uma ramificação dos neandertais.
Grande parte dos especialistas acredita que o homem-dragão não seja uma espécie distinta. Eles apontam para uma mistura semelhante de traços modernos e traços mais antigos em um fóssil conhecido como crânio de Dali, classificado no mesmo grupo do crânio de Harbin. Esse crânio foi encontrado na província de Shaanxi, na China. Especialistas o consideram uma espécie própria: o Homo daliensis. Há ainda os misteriosos denisovanos que não são reconhecidos como uma nova espécie, esse grupo provavelmente habitou a Ásia por milhares de anos.
Foi anunciado em 2019, a importante descoberta de uma mandíbula (fraturada) localizada no planalto do Tibete, possivelmente de um denisovano, o que seria o primeiro fóssil desses humanos antigos encontrado fora da caverna que deus origem ao nome do grupo. Essa mandíbula é chamada de ‘mandíbula de Xiahe’, e talvez haja um parentesco mais próximo com o homem-dragão.
Novas análises indicam que um ancestral comum do Homo sapiens se subdividiu em dois grupos: os Neandertais, que se espalharam pela Europa e Oriente Médio, e os denisovanos, que se distribuíram pela Ásia.
Há uma grande possibilidade de que sejam realizadas análises genéticas no homem-dragão, mas esse processo requer a destruição de amostras do fóssil. Mesmo que o homem-dragão não seja uma nova espécie, suas características são provas de que a natureza raramente segue regras. “A distinção de uma espécie é, na realidade, mais uma questão filosófica do que uma verdade biológica”, observa Laura Buck, antropóloga biológica da Universidade Liverpool John Moores, que não integrou a equipe do estudo.
O banco de dados completo da equipe e imagens detalhadas do homem-dragão foram disponibilizados ao público, conta Stringer, para que outros pesquisadores possam analisar as complexidades por conta própria.
Fonte: National Geographic